Seminarista da Consolata relata experiência na Colômbia.
Por Sandrio Cândido Pereira
Sair não é uma experiência fácil. Sair Implica mudanças interiores. Sair nos conduz a acolher novas formas de navegar. Nós, seres culturais, acostumados a viver de acordo com hábitos agregados ao nosso perfil ao longo dos anos. Sair significa abrir os olhos para outras praias, pois em nosso coração habita a sede de outras águas. Somos parte de uma cultura e a cultura é parte do que somos; melhor dizendo é parte daquilo que vamos sendo no mundo. Sair significa reconhecer que esta cultura também é parte de um mar maior, cuja grandeza descobrimos quando estamos dispostos a deixar nossas terras, nossas maneiras de conceber a vida, nossos jeitos de estar no mundo. Sair é ter adiante uma incerteza grande, por isso nosso instinto tem medo de sair, tem medo de experimentar o novo que nos chama. Entretanto estou cada vez mais convencido, vencer o medo de sair nos faz crescer como seres humanos.
A vida missionária é uma constante saída, é através desta que aquela vai tecendo seus próprios arranjos, como fazem as bordadeiras em Minas Gerais, quando a cada linha o agasalho torna-se um pouco mais forte. A imagem sempre me pareceu linda, o ato de costurar a vida missionária, o ato de tecer a nós mesmos, pois a vida missionária não é somente uma entrega a Deus e aos outros, mas também uma maneira de nos construímos como seres humanos. É um convite a não instalar-nos apenas em um ponto de vista, seja ele pessoal, social, político, cultural, eclesial, mas a aprender olhar o mesmo horizonte sem perder a singularidade de cada um. Esse ano Deus me convidou a seguir costurando a vida missionária na Colômbia.
No começo uma nuvem tomou conta do meu coração; tive medo, a barca parecia andar demasiado longe para eu poder embarcar. Quando embarquei descobri que não podia levar muita bagagem, pois a tripulação era maior, não apenas os colombianos navegariam comigo, mas, toda a comunidade religiosa na qual estou, sendo essa formada por pessoas de distintos países: Brasil, Colômbia, Quênia, México, Moçambique, Tanzânia, Uganda. Em cada um dos meus irmãos há uma costura cuja tecedura se vai aos poucos entrelaçando com a minha, formando assim a comunidade dos Missionários da Consolata em Cali. Os primeiros contatos com o idioma, a música, as celebrações, a dança, os cheiros e sabores desta cultura, tudo acompanhado pela certeza de estar aqui por uma razão: Jesus Cristo e o propósito de configurar a minha vida com ele dentro do carisma pertencente ao Instituto Missões Consolata.
Aqui fui presenteado com uma nova maneira de viver a formação, as pequenas comunidades formativas apostólicas, também com a pastoral afro, na qual pude aprofundar a minha própria identidade como afro latino-americano. Também estive com os indígenas, celebrando com eles a Semana Santa, aprendendo outra forma de ser cristão-católico, descobrindo novas maneiras de viver, desde a simplicidade, colocando os passos e o coração em terras sagradas. Entretanto, o maior presente nestes dois meses é o de estar crescendo nesse itinerário de saída, a certeza de estar navegando com a alegria de quem pode olhar o horizonte com olhos alargados. Essa alteridade, esse descalçar as sandálias para entrar em território alheio, esse viver como uma busca por abrir-se cada vez mais a pluralidade. Por enquanto, minha experiência tem sido aquela de olhar e acolher, de estar e buscar. O mais difícil de sair não é embarcar o corpo, mas o coração e os olhos, esses são tentados a ficar onde estávamos antes, de certa forma sempre fica um pouco deles, nos apegamos demasiado aos lugares onde estivemos. A experiência de trazê-los para dentro do espaço onde estamos nos permite descobrir a beleza de ser tão diferente, ainda assim, todos humanos.